domingo, 8 de janeiro de 2012

Enfraquecendo o Choro Operante

           Pode-se afirmar que no início da vida o choro ocorre, em sua maior parte, por meio de um conjunto de respostas reflexas, envolvendo principalmente contrações do diafragma. Tais choros são contíguos à privação de reforçadores primários. Com o tempo surgem variações na forma como ocorrem os prantos, suas motivações assumem outros contornos, variam também as entonações dos gritos.
            A princípio, quando em privação de alimento, a criança chora e sua mãe lhe fornece alimento, saciando-a. Juntamente a essa saciação recebe atenção e carinho, que posteriormente adquirem função reforçadora. Com o tempo a criança se desenvolve e seu repertório comportamental torna-se mais complexo, e uma série de comportamentos passa a ser reforçada por reforçadores condicionados. O choro, aos poucos, passa a constituir-se também por respostas operantes.
            Alguns choros parecem ser quase totalmente operantes, e nem sempre são fortalecidos por reforço primário. Um dos mais poderosos reforçadores condicionados que podem estar ligados com a origem e manutenção do choro operante é a atenção, fornecida pelo contato social.
Nem sempre a criança pode ser reforçada positivamente, quando não recebe reforçamento em determinada ocasião, ela geralmente recorre a comportamentos que anteriormente foram eficazes na obtenção de reforço, o choro é primeiro da lista. Como o choro de uma criança sempre acaba tornando-se uma condição aversiva, o adulto acaba por atender às exigências do pequeno, para parar o choramingo. Dessa forma o comportamento de chorar é reforçado pela submissão e atenção do adulto. Em situações posteriores provavelmente a criança choramingará novamente para conseguir o que quer. Tornou-se “mimada”.
Creio que era esse o caso de minha sobrinha, de dois anos e um mês de idade. Ela vinha apresentando comportamentos típicos de uma criança mimada. Quando suas requisições não eram atendidas, chorava desvairadamente jogando-se no chão, muitas vezes batendo propositadamente com a cabeça. Após esta cena os adultos sempre lhe davam atenção e atendiam a seus pedidos, ou seja, reforçavam positivamente o comportamento.
Num belo dia, minha prima (de 09 anos) e eu estávamos assistindo o desenho animado “Yin Yang Yô”, e enquanto isso minha sobrinha estava choramingando, querendo sair para o quintal. Como eu queria ver o desenho, resolvi tentar enfraquecer o comportamento de chorar da pequenina com algumas técnicas que aprendi no laboratório de Psicologia Experimental.       
            Comecei instruindo minha prima a não dar atenção nenhuma ao choro de minha sobrinha, quando ela começava a chorar escondíamos nossos rostos atrás de almofadas até que ela parasse. Ao fazer isso estávamos aplicando uma Punição Negativa, onde a consequência do comportamento é a retirada do reforçador positivo (chorar tinha como consequência a retirada da atenção). A princípio ela começou a chorar mais alto (na Caixa de Skinner ratos e pombos também apresentam reações semelhantes no início de um processo onde o reforçador é retirado).
Depois de alguns minutos chorando na sala, onde o choro resultava na retirada da atenção, saiu correndo em direção à cozinha, onde minha mãe estava. Mamãe relutou um pouco, mas logo entendeu a jogada e passou a ignorar o choro. Sem receber atenção na cozinha, minha sobrinha retornou à sala gritando em plenos pulmões. Minha prima e eu imediatamente cobrimos novamente nossos rostos com as almofadas, o que fez minha sobrinha empenhar-se ainda mais nos gritos e correr para a varanda, onde se deitou e chorou por mais uns três minutos.
 Quando finalmente parou de chorar, retornou à sala onde se sentou quietinha. Dez minutos depois choramingou novamente, ignoramos de novo. Com o tempo o choro passou a ficar cada vez mais “forçado”, denunciando ainda mais sua natureza operante. Depois notamos que a frequência e a intensidade dos choros começaram a diminuir. No dia seguinte continuamos com este método, e tivemos como resultado a total ausência de pirraça. Minha sobrinha ficou uma “doçura”, um verdadeiro anjinho. Podíamos assistir desenhos e ouvir músicas sem incomodo algum.
Infelizmente no terceiro dia o comportamento de fazer birra reapareceu (fenômeno conhecido na literatura behaviorista como “recuperação espontânea”) em consequência da chegada de minha irmã e de meu pai, pessoas que anteriormente forneceram muitos reforços ao comportamento mimado de minha sobrinha, sendo assim compuseram a ocasião para a recuperação do comportamento. Mas não tem problema, já conhecemos a fórmula para controlar a situação novamente.
Apesar do fato de que o procedimento exposto acima não foi administrado no ambiente controlado de um laboratório de Psicologia, ficou nítida a forma como o comportamento mimado de minha sobrinha estava sob controle de reforçadores sociais como a atenção e afeição. Levando-se em conta os princípios da aprendizagem especificados pelo Behaviorismo, já era de se esperar a forma como o comportamento indesejado enfraqueceu-se após a retirada dos reforçadores. A óbvia conclusão a que nós podemos chegar é de que os adultos, sem saber, condicionam nas crianças os comportamentos inadequados de que tanto se queixam. Porém, com conhecimento básico dos princípios da aprendizagem e paciência (muita paciência), é possível modificar comportamentos de forma cuidadosamente planejada em nossas crianças.
Ah! Já ia me esquecendo! Nem sempre o comportamento que os pais acham conveniente é o comportamento adequado a uma criança. Por exemplo, pais extremamente autoritários costumam desejar filhos submissos. Assim, para evitar punições, uma criança pode crescer alimentando uma postura subordinada, o que certamente lhe renderá dificuldades quando adulto.

Thiago R. Rocha

2 comentários:

  1. Muito bom o texto, Thiago.
    Destaca-se um elemento importante na realização deste experimento-técnica:
    Quando um comportamento está em fase de extinção é comum a emissão pelo sujeito de comportamentos emocionais de agressividade e/ou aumento da frequência do comportamento que se deseja extinguir ou diminuir sua frequência. Portanto, não se intimidem caso esses "efeitos colaterais" surjam no processo.

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